quarta-feira, 4 de junho de 2025

A província de Chubut, na Patagônia Argentina, é última fronteira do vinho no Hemisfério Sul

Todos que são apaixonados por vinhos sabem que a grande maioria das regiões vitivinícolas do mundo encontram-se entre os paralelos 30° a 50° Norte e Sul, consideradas as latitudes ideais para o crescimento da videira e a produção de vinhos maravilhosos.

Porém, esse é o mundo ideal, pois a geografia local muitas vezes impõe vários desafios aqueles que se dedicam a vitivinicultura, principalmente quando ela ocorre nas latitudes mais extremas desses 30° a 50°, consideradas ideais.

No continente americano, com exceção da América Central, pode-se encontrar regiões vitivinícolas desde a latitude de 46° Sul na Argentina, até a de 53° Norte no Canadá. Isso proporciona uma imensa diversificação de climas, relevos, características ambientais e legados históricos, que contribuem de forma decisiva para a grande variedade de vinhos que temos no continente americano.

O mapa da América do Sul tem a forma aproximada de um triangulo invertido, assim quanto mais para o Sul menor é a quantidade de terras emersas. As correntes marítimas frias (Humbolt no Pacífico e Malvinas no Atlântico), exercem forte influência no clima em latitudes acima de 45° Sul, além das constantes ondas de frio oriundas da Antártica. Isso, praticamente inviabiliza a vitivinicultura em latitudes maiores que 46° Sul, ao contrário da América do Norte onde, há maior quantidade de áreas emersas e vinhedos em latitudes acima de 50° Norte.

A província de Chubut, no coração da Patagônia Argentina, é a província vitivinícola mais austral (do Sul) das Américas. Está localizada entre as latitudes de 42° Sul na fronteira com a província de Rio Negro, e de 46° Sul na fronteira com a província de Santa Cruz. É limitada a Oeste pela Cordilheira dos Andes (71° Oeste) e a Leste pelo Oceano Atlântico (65° Leste). É considerada a “Última Fronteira do Vinho" devido ao seu clima extremo e condições desafiadoras que tornam a produção de vinho um feito heroico. 

Regiões vitivinícolas na província de Chubut

Na província de Chubut duas regiões são importantes para a vitivinicultura, os Andes e a Planície Central.

Os Andes, localizados na porção mais a Oeste da província, estão presentes ao longo da fronteira com o Chile, onde os ventos úmidos oriundos do Oceano Pacífico, se elevam e ultrapassam a cordilheira, fazendo com que a umidade precipite no lado argentino dela, deixando o restante da província em direção ao Leste, árida.

O relevo de cordilheira nessa região se destaca por seus picos com altitudes entre 1.500 e 2.000 metros, que vão decrescendo em direção ao Sul da província.  É onde o clima frio desafia a produção de variedades de uvas tradicionais, destacando-se o predomínio das variedades brancas.

É nessa porção da província de Chubut mais ao norte, entre as latitudes de 42° e 43° Sul, na cordilheira, que estão localizadas duas importantes áreas vitivinícolas, El Hoyo e Trevelin.

Planície Central ocupa cerca de 80% do território da província de Chubut. Apresenta um relevo de planície e alta aridez, ou seja, é o oposto da região dos Andes.  É caracterizada por sua superfície plana e de baixa altitude, em torno de 300 metros. Essa é a porção mais árida e plana de Chubut.

No extremo sul da província, mais próximo do Oceano Atlântico do que da cordilheira, está localizada outra área vitivinícola importante, Sarmiento, na latitude de 45°55’Sul. Esse é o ponto mais Austral da vitivinicultura no hemisfério Sul, uma vez que está mais ao Sul que a província de Queenstown, na Nova Zelandia, que está a 45°31’S.

Clima das regiões vitivinícolas da província de Chubut

O tipo climático predominante na província é frio e semiárido, com uma grande amplitude térmica diária. As temperaturas médias anuais variam de 8°C a 12°C. No inverno, podem chegar a -10°C e no verão, podem atingir mais de 40 °C. A média anual de precipitação pluviométrica é de cerca de 250mm, com chuvas mais concentradas entre os meses de abril e maio.

Contudo, há que se ter em mente que as condições climáticas sofrem mudanças importantes à medida que nos afastamos da Cordilheira, mais úmida e mais “verde”, e nos aproximamos da costa do Atlântico, mais seca. Apesar de que a maioria das vinícolas produzam vinhos com as mesmas variedades de uva, essa diferença entre o clima de montanha e o de planície, se refletirá nas características dos vinhos.

 A porção andina da província, onde estão localizadas as áreas vitivinícolas de El Hoyo e Trevelin, se destaca por seus picos nevados durante todo o ano e condições climáticas extremas. Apresenta verões curtos e secos, influenciado pela alta altitude e predomina o clima semiárido frio e mediterrâneo subalpino

A altitude é um fator determinante na definição deste clima. As temperaturas baixam consideravelmente durante o inverno, com temperaturas que diminuem com a elevação e a formação de paisagens montanhosas sendo a média anual de 8°C, não raro elas chegam a 0° C.  As precipitações variam de 700 mm a mais de 2.500 mm/ano e a ocorrência de neve durante o inverno.

O clima frio os ventos fortes e as geadas conferem aos vinhos dessas áreas vitivinícolas características únicas, como frescura, notas frutadas e boa acidez.

Na maior parte do território da província de Chubut predomina o tipo climático Árido Frio que corresponde a Planície Central. É caracterizado por verões quentes e invernos frios, pela grande variação de temperatura anual e pela alta diferença de temperatura entre o dia e a noite. 

Em Sarmiento o clima é árido frio, com verões ensolarados, porém com invernos frios, grande amplitude térmica e precipitação média ao redor de 200 mm/ano. Nessa parte da província as temperaturas no verão, podem atingir mais de 40 °C, sendo a temperatura média anual de 10° a 12 °C.

As latitudes abrangidas pelo território da provincia de Chubut está entre 42° Sul e 46° Sul. Asssim, desde o Norte até o Sul da provincia são pelo menos 4 diferentes latitudes, sendo que a distância em km entre cada uma delas é de aproximadamente 111km. Essas distâncias são suficientes para que a provincia apresente climas diferentes entre o Norte e o Sul, o que seguramente irá interferir diretamente no cultivo das uvas e no vinho produzido, mesmo que a maioria das vinícolas cultivem as mesmas variedades de uvas.

Assim, na provincia de Chubut as temperaturas, entre a porção Norte (menor latitude) e a porção Sul (maior latitude), variam ao longo do ano. No inverno, a temperatura média nos meses mais frios varia de 6° a 7 ° nas partes do Norte da província (El Hoyo e Trevelin), e de 4° a 7 °C nas partes do Sul (Sarmiento). 

Uma característica definidora do clima na província de Chubut é o vento forte presente em todo o seu território. Ele é um fator adicional que torna a maior parte dela seca, uma vez que favorece a evaporação da umidade.

Mas porque descrever com mais detalhes o clima de uma região vitivinícola? Porque todas essas variáveis climáticas definem o tipo de vitivinicultura, as variedades cultivadas e os tipos de vinhos produzidos nela, em qualquer parte do mundo.

A vitivinicultura em Chubut ainda é jovem, porém já demonstra um grande potencial sendo a Pinot Noir a estrela da Patagônia Austral. É a variedade que se destaca na região, sendo praticamente cultivada por todas as vinícolas.

A influência do clima na vitivinicultura fica evidente se tomarmos como exemplo essa variedade, que é cultivada em Mendoza e em Chubut. Em ambas as províncias essa casta inicia sua brotação na mesma época do ano, mês de outubro. Porém, o período de colheita é diferente de uma para outra, e a latitude e o clima local são fatores importantes nessa diferença.

Mendoza está a 32°89’ S e a 853m de altitude e Trevelin, em Chubut, está a 43°09’ S e a 380 m de altitude. Mesmo Mendoza estando a 473 metros de altitude acima de Trevelin, as temperaturas nessa são menores, porque a latitude é maior.  Veja os gráficos de temperatura e precipitação que seguem. 

Em Mendoza a colheita acontece entre o final de janeiro e início de fevereiro, já em Chubut a colheita tem início em meados de abril, isso se deve ao frio nessa região que exige um tempo de cultivo maior para o amadurecimento das uvas. Essas diferenças no clima, irão aparecer de forma significativa no perfil sensorial do Pinot Noir de cada uma das regiões, na hora da degustação.

O clima frio de Chubut, ventoso, com verões curtos, invernos rigorosos e ventos constantes, faz com que as vinhas cresçam em um ritmo lento, resultando em vinhos mais delicados, leves, de alta acidez e aromas refinados.

Em Chubut cultivam-se variedades mais adaptadas ao clima frio e de ciclo curto, como a Chardonnay, Gewürztraminer, Pinot Gris, Riesling, Sauvignon Blanc, Pinot Noir e Merlot.

Terroirs Únicos:

A produção de vinho em Chubut impulsiona a indústria do vinho argentina, para além das regiões mais tradicionais, como Mendoza, mostrando que é possível produzir vinhos de alta qualidade em regiões antes consideradas impróprias e de grandes desafios para o cultivo de uvas.  

A região de El Hoyo, no extremo Norte, expressa a sua tipicidade, com vinhedos que foram recuperados após um incêndio e que agora produzem vinhos com alta qualidade e identidade.  Nela são encontradas as seguintes vinícolas:

Patagonian Wines: é a bodega pioneira na produção de vinhos na região.  Fundada por Bernardo Weinert, um brasileiro radicado na Argentina, com o enólogo Darío González Maldonado, deu início a produção vitivinícola da Patagônia. Situada a 10 km ao Sul do paralelo 42° Sul, a 300m acima do nível do mar e a 17Km da fronteira com o Chile. O primeiro vinhedo, da variedade Merlot, foi plantado em 1998. Possui 12,5 hectares, dos quais 10,5 são cultivados com Merlot, Pinot Noir, Chardonnay, Riesling e Gewürztraminer. Devido ao sensível aumento das temperaturas, nos últimos anos, castas tintas de ciclo mais longo, como a Merlot, têm se adaptado muito bem na região. A vinícola produz cerca de 80.000 garrafas por ano.

(https://patagonianwines.com/)

Bodega Y Viñedos Ayestarán Allard: produz vinhos com a Indicação Geográfica (IG) El Hoyo. A vinícola boutique está localizada nas encostas da colina Currumahuida. As variedades plantadas são Chardonnay, Gewürztraminer, Riesling, Sauvignon Blanc, Merlot e Pinot Noir. Os verões frescos e de grande amplitude térmica permitem uma maturação prolongada e completa das uvas. Além disso, os solos, predominantemente argilosos e permeáveis, acumulam as águas das chuvas, dispensando a irrigação artificial.

(https://www.instagram.com/bodega.ayestaran/  https://www.facebook.com/profile.php?id=61555137437984#)

Na região de El Hoyo são encontradas também as vinícolas Bodega Chacra Adamow, Bodega y Viñedos Oriundo e Mammarelli Wines.

Na região de Trevelin destacam-se as seguintes vinícolas:

Viñas del Nant y Fall: Vinícola pioneira na região, localizada a 12 km de Trevelin, na Ruta 259 que leva ao Chile. Um empreendimento familiar iniciado em 2010 e que se tornou um ponto para o enoturismo. Tem plantado 2,5 hectares de videiras, que produzem cerca de dez mil garrafas. As principais variedades são a Pinot Noir original e a Chardonnay, Gewürztraminer, Riesling e algumas fileiras de Torrontés. 

(https://www.instagram.com/vinasdelnantyfall/?hl=es; https://blog.winesofargentina.com/pt-pt/wofa-pt/vinas-de-nant-y-fall/)

Casa Yagüe Vinos Australes: Localizada a 22 km de Trevelin, produz vinhos com foco na sustentabilidade e produção artesanal. Iniciou sua produção em 2014, com o plantio de uvas Chardonnay e Sauvignon Blanc. O primeiro vinho foi lançado em 2017. Atualmente tem vinhedos das variedades Semillón, Marsanne, Cabernet Franc, Pinot Noir e Malbec.

(https://www.instagram.com/casayague/; https://www.interpatagonia.com/trevelin/casa-yague-discovering-southern-wines.html)

Contra Corriente:  O nome da vinícola é inspirado no fato de que as trutas, peixe típico da Patagônia, nadam contra a corrente em águas rasas, no período da desova. A bodega tem 4 hectares de vinhas plantados em solos que variam de aluviais a argilo-glaciais.  As castas são Pinot Noir, Chardonnay, Gewürztraminer e Riesling, produzindo menos de 10.000 garrafas de vinho por ano. Contra Corriente é um projeto de dois amigos de infância, pioneiros em uma nova região vinícola. É uma das primeiras vinícolas a utilizar o clima extremamente frio e o terroir do Sul da Patagônia para produzir vinhos únicos, gastronômicos e frescos, mais complexos e intensos.

(https://contracorrientewinery.com/)

Em Trevelin também podem ser encontradas as vinícolas Familia Schroeder, Bodega Ribera del Cuarzo e a Bodega Miras

Em agosto de 2020 o Instituto Nacional de Vitivinicultura reconheceu Trevelín como Indicação Geográfica (IG). É uma das mais novas indicações geográficas (IG) da Argentina, alcançada em 2020.

Na região de Sarmiento, no extremo Sul da província de Chubut, destaca-se a vinícola Bodega Otronia, situada “En La Frontera de lo Posible” conforme mencionado no site da vinícola. É a vinícola mais austral do mundo e se autodenomina "Patagônia Extrema", devido ao clima extremo e ao desafio de cultivar videiras nessa região Sul do planeta. Localizada no coração da Patagônia, no paralelo 45°33’ Sul, é provavelmente, a última fronteira do Sul para cultivar videiras.  Está localizada as margens do Lago Musters e o nome Otronia vem dos antigos povoadores que chamavam de Otrón esse lago.  O clima frio de Sarmiento tem grande influência no caráter dos vinhos, na acidez, na pureza e no perfil aromático distinto. O plantio de uvas começou em 2010 com as variedades Chardonnay, Gewürztraminer, Pinot Gris, Riesling, Torrontés, Pinot Noir, Merlot e Malbec.

(https://www.otronia.com/)

Devido ao fato dessas vinícolas estarem localizadas na porção mais austral possível para a produção de vinho, as torna únicas e um verdadeiro desafio, mas ao mesmo tempo uma experiência enriquecedora para a vitivinicultura. 

Fontes:

https://vaocubo.com/2023/07/11/chubut-ultima-fronteira-do-vinho-argentino/#:~:text=LocalizadanaPatagoniaargentinafaz,encabeçadospelostehuelchesemapuches.

https://vaocubo.com/2023/07/11/chubut-ultima-fronteira-do-vinho-argentino/#:~:text=Chubutconhecidaser,produzindovinhosdealtaqualidade.

https://www.wine-searcher.com/regions-patagonia?srsltid=AfmBOoogR95v60AHz7KDjOR7gcg1bXRcgSQSqnETyNYq3eqhCnBol3N9

https://tribunademinas.com.br/acervo/da-vinha-ao-vinho/09-09-2023/descubra-chubut-na-patagonia-a-ultima-fronteira-do-vinho-argentino.html

https://blog.winesofargentina.com/pt-pt/breaking-pt/comarca-andina-2/


 







Nenhum comentário:

Postar um comentário

A província de Chubut, na Patagônia Argentina, é última fronteira do vinho no Hemisfério Sul

Todos que são apaixonados por vinhos sabem que a grande maioria das regiões vitivinícolas do mundo encontram-se entre os paralelos 30° a 50°...